Brasil gasta o equivalente a 11,6% do PIB com logística em rodovias
Brasília cumpriu o seu papel agregador. O centro-norte do país, desconectado das decisões políticas e econômicas nacionais da década de 1950, transformou-se em um dos propulsores do desenvolvimento nacional — a ponto de ser uma das regiões brasileiras que menos tem sentido a atual crise econômica. Entretanto, 60 anos depois da redescoberta do interior do Brasil e de toda a tentativa de integração, ainda é imperioso intensificar caminhos e abrir rotas. Para cumprir o seu papel logístico brasileiro, os gargalos precisam ser resolvidos. É necessário otimizar as distâncias e reduzir o tempo para que os produtos brasileiros possam ser mais competitivos, como mostra a última reportagem da série que aborda, desde segunda-feira, o avanço e a independência da malha rodoviária brasileira.
Informações do Plano de Transporte e Logística da Confederação Nacional do Transporte (CNT) apontam que, no Brasil, os custos logísticos representaram 11,6% do Produto Interno Bruto (PIB). Em comparação, nos Estados Unidos, a porcentagem é de 8,7%. O alto custo do frete impacta diretamente no preço final da mercadoria. “Os produtos manufaturados em Manaus, como televisores, por exemplo, têm incentivo fiscal, mas, até chegar ao consumidor final, no Sul-Sudeste do país, precisam ficar uma semana no barco, mais um tempo no caminhão. Quando essas TVs chegam ao destino, são mais caras do que as que vêm da China. Os custos do transporte estão atrapalhando a competitividade”, exemplifica Wilson de Oliveira, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Goiás (Fieg).
As causas para o alto custo logístico das mercadorias brasileiras esbarram na infraestrutura que contribui diretamente para o Custo Brasil. A questão tem inibido a competitividade do país e da região e, na análise da CNT, fica à frente de outros delicados gargalos brasileiros, como a questão tarifária, a ineficiência burocrática e as leis trabalhistas. No ranking do Fórum Econômico Mundial com 148 países, o Brasil está em 120º em relação à qualidade das estradas, em 103º na infraestrutura ferroviária, em 131º em estrutura portuária e em 123º em relação ao transporte aéreo. A preocupação com o escoamento de produção é uma das principais discussões do Fórum de Governadores do Brasil Central.
Os produtores rurais do município de Cristalina (GO), por exemplo, esbarram nas dificuldades de levar as commodities para a exportação, em sua maioria, via Porto de Santos, em São Paulo. Por causa do clima, da altitude e das técnicas de precisão, a cidade tem um dos mais expressivos PIBs agrícolas do país.
Entretanto, toda a redução de perda durante a produção é dissipada no valor do transporte. “O frete é um custo fora da porteira, que o agricultor não consegue administrar e não tem como cortar. De um ano pra cá, cada saca subiu 5%, devido aos gastos com transporte”, explica Alécio Maróstica, presidente do Sindicato Rural de Cristalina. Para ele, o alto custo do caminhão, os pedágios e a demora para o pleno funcionamento da ferrovia Norte-Sul são os entraves imediatos para aumento do preço do transporte.
As más condições das estradas, a falta de integração entre os modais — aquaviário, ferroviário, rodoviário e aeroportuário — e de planejamento fazem o Brasil perder dinheiro com o transporte. O país gasta mais com previdência e hospital de vítimas de acidentes de trânsito do que com a manutenção das vias, conforme mostra estudo da CNT. “A má conservação das estradas e as poucas alternativas de modais transportam para o usuário o ônus dessa condição. Por exemplo, no transporte de cargas, o caminhão vai gastar mais tempo para fazer a jornada do que o trem, o custo de manutenção sobe se estoura um pneu ou se gasta mais diesel em um engarrafamento de uma pista não duplicada. Todo esse custo vai sendo embutido no frete”, comenta Bruno Batista, diretor-executivo da CNT.
“Sentimos na contabilidade o aumento dos preços. O pedágio, o diesel e a condição das estradas — principalmente na região Norte — impactou de 30% a 40% nos custos do nosso serviço nos últimos 12 meses. Para continuar operando, a saída foi reduzir a margem”, explica Cléber Ângelo Ravanello, um dos proprietários da Práttica Logística, especializada em fretes interestaduais.
Enquanto isso, o trabalhador que está na lida do dia a dia sofre na pele o peso do custo do transporte. Por causa da crise econômica e do preço alto do frete, o serviço diminuiu. “Na empresa em que eu trabalho, eram 40 caminhões. Em um ano, diminuíram para 22 e pode ter mais cortes”, lamenta o caminhoneiro Israel Alves dos Santos, 42 anos.
Orçamento concentrado
Embora a aposta nas rodovias tenha interligado o país, na opinião de especialistas, é preciso ir além e discutir elementos, como a desconcentração do modelo rodoviário e a conexão de diferentes modais, em especial o ferroviário e o aquaviário. A solução estaria em um estudo aprofundado das viabilidades econômicas dos tipos de transporte para cada região do Brasil, de acordo com as respectivas distâncias e demandas e o tipo de carga a ser transportado. Com o estudo, seria possível ter diretriz mais específica e evitar obras sem conexão, como, por exemplo, as bitolas diferentes das ferrovias brasileiras, que deixam a operação mais complicada.
Porém, o governo brasileiro não consegue avançar nem sequer na elaboração de estudos. Em 1964, os militares fizeram um Plano Nacional de Viação, com obras grandiosas e execuções que não seguiram o esperado. O mais recente estudo é o de 2007, o Plano Nacional de Logística e Transportes, feito durante a gestão de Lula. Entretanto, o plano ficou só no papel, assim como outros já escritos. “O estudo é um avanço em um país que tem dificuldade de planejamento, mas não adianta ter o plano e não mudar as direções orçamentárias”, analisa Bruno Batista, da CNT. Ele faz referência ao fato de que a porcentagem de verba destinada aos diferentes modais permanece a mesma: predomínio de dinheiro para as rodovias e má distribuição do restante dos recursos entre os demais modais. Até junho de 2016, por exemplo, dos R$ 5,82 bilhões usados com transporte pela União, 78,4% foram com o tipo rodoviário; 9,4%, com ferrovias; 10,4%, com o setor aéreo e apenas 1,9%, com o aquaviário.
Uma questão de planejamento
A logística é definida como o processo de planejamento, implementação e controle dos fluxos de insumos e produtos na cadeia produtiva, de modo que as mercadorias possam ser transportadas, desde as origens até os destinos, em tempo hábil e em conformidade com as necessidades de quem demanda.
Custo Brasil
O Custo Brasil é um termo que abrange questões legais, institucionais, burocráticas e de infraestrutura, que condicionam as atividades econômicas e sociais em seus diversos aspectos, restringindo o crescimento econômico e impondo impactos negativos à sociedade em geral.
Por: Redação Na Boléia