Atraso na baixa de gravame pode gerar dano moral?
A opção pelo financiamento bancário no momento da aquisição de um veículo automotor é uma prática costumeira no mercado, senão a preponderante. Por intermédio do contrato de financiamento, o adquirente escolhe uma instituição financeira para realizar o pagamento integral do veículo à concessionária ou loja, enquanto o bem passa ser a garantia de pagamento dessa dívida. Consequentemente, o comprador transfere o veículo à instituição financeira enquanto paga por ele e, uma vez quitado o valor negociado, poderá transferi-lo ao seu nome. Essa modalidade de financiamento é a chamada alienação fiduciária.
Diante dessa negociação, formaliza-se um gravame sobre o veículo perante o Departamento Nacional de Trânsito (DETRAN), o qual restringe a transferência do automóvel até o cumprimento integral do contrato de financiamento.
Uma vez que o comprador quita o débito, compete à instituição financeira, no prazo máximo de 10 (dez) dias, providenciar a baixa do gravame, automática e eletronicamente, perante o órgão ou entidade executiva de trânsito em que o veículo estiver registrado, conforme dispõe o art. 9º da Resolução nº 320/2009 do CONTRAN (Conselho Nacional de Trânsito).
É comum, no entanto, a baixa do gravame não ser providenciada no prazo e o adquirente, ao iniciar o procedimento de transferência, ser surpreendido com a existência de restrição sobre o bem. Em consequência disso, inúmeros casos foram levados ao Poder Judiciário, e se discutiu se esse atraso gera presumidamente um dano moral indenizável e, de fato, existem demandas dos anos anteriores em que se considerou a configuração do dano moral em razão da manutenção indevida do gravame.
Cite-se como exemplo: TJ-PR – APL: 15764575 PR 1576457-5 (Acórdão), Relator: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho, Data de Julgamento: 08/02/2017, 17ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 1977 23/02/2017.
Ocorre que, em julgamento de recurso submetido ao Superior Tribunal de Justiça, a Corte Superior proferiu importante decisão em sentido contrário (Recurso Especial nº 1.812.127/RS). Nesse caso, havia sido reconhecida a existência de danos morais ao adquirente do veículo, porém, a Ministra Nancy Andrighi entendeu que a decisão deveria ser reformada, sob o fundamento de que esse tipo de acontecimento não enseja o reconhecimento de dano moral presumido.
Dessa forma, por intermédio do referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça se manifestou no sentido de que o atraso na baixa de gravame de alienação fiduciária, por si só, não enseja dano moral ao adquirente do bem, devendo, com isso, ser comprovados em cada caso concreto circunstâncias e fatos que agravem a situação da parte lesada, em razão dessa falha na prestação dos serviços da instituição credora.
Necessário, portanto, que o autor comprove a ocorrência de um prejuízo efetivo e concreto por motivo do atraso, passível de gerar um dano que ultrapasse a esfera do mero aborrecimento.
Ressalta-se que esse entendimento do Superior Tribunal de Justiça ainda não é definitivo e uniformizado, pois, diante da multiplicidade de recursos versando sobre a matéria, a Corte Superior decidiu submeter a questão a julgamento, visando deliberar especificamente sobre o tema e firmar um entendimento uníssono.
Por esse motivo, houve a suspensão nacional do processamento de todos os processos pendentes que versem sobre a questão (Tema 1.078) e, após a votação definitiva pelo Superior Tribunal de Justiça, as demandas seguirão o seu curso normal para julgamento. Trata-se de medida que facilita a solução de demandas repetidas no Poder Judiciário e preserva a segurança jurídica, no sentido de evitar resultados opostos em situações coincidentes.
Camilla Oshima é advogada do Departamento de Contencioso e Arbitragem da Andersen Ballão Advocacia.
Por Redação Na Boléia