Ao comprar equipamentos, os transportadores precisam olhar um pouco além da capacidade volumétrica e, principalmente, questionar as “promessas” que oferecem vantagens sem informar os riscos

Encerrada a Fenatran 2015, vamos a algumas considerações. Durante a realização do Salão, comentava-se pelos corredores que a Volvo teria vendido entre 600 e 800 caminhões e a DAF outros 40, e isso somente no primeiro dia. Verdadeiros ou não, o fato é que frente à debandada geral das montadoras, com a presença de apenas essas duas únicas representantes do segmento, teve origem um outro comentário: que essa edição deveria ter se chamado Salão do Implemento, e não do Transporte Rodoviário.

Vou mais além. Na minha modesta opinião, o título mais adequado seria Salão do Complemento. Apesar dos implementadores terem ocupado o maior espaço físico no pouco de área utilizada do Pavilhão do Anhembi, não era maioria em número.

Se as montadoras estiveram ausentes, o mesmo se viu entre os fabricantes de pneus. Presentes, somente a Continental, além de um importador. Entre os fornecedores de material para reforma de pneus, apenas três representantes.

O que se viu mesmo foi a presença de fornecedores de produtos e serviços diversos, e incluo entre esses, os implementadores. Sim, porque são, na verdade, complementos para os veículos. Você pode comprar um caminhão, seja ele um cavalo mecânico ou um chassi-cabine, e não fará nada com ele sem um complemento, um reboque, semirreboque ou carroceria. Na prática, complementam o veículo trator.

Chamou a atenção no Salão a crescente participação de produtos fabricados em alumínio, desde implementos, rodas e tanques, até 5ª Roda e um protótipo de chassi completo. Entre os implementos, o apelo foi do menor peso do equipamento (tara) e consequente aumento da carga líquida como vantagem frente ao elevado preço quando comparado aos implementos tradicionais. E neste aspecto há um detalhe que, ao que parece, ninguém deu a devida atenção: os pneus.

No estande da Volvo, o destaque ficou com os modelos FH 750 e os FMX, equipados com pneus de medidas 315/80R22,5 e 325/95R24, respectivamente. Se no caso do FMX muitas pessoas com quem conversei ficaram admiradas por utilizar pneus com câmara, o que chamou a minha atenção foi o emprego de pneus de perfil alto, contrariamente à maré de fabricantes de implementos, que expuseram produtos com pneus super-single e pneus 385/65R22,5, de perfil baixo.

Entre os produtos expostos, um conjunto bi-trem silo para cimento totalmente construído em alumínio apresentava a seu lado um totem com as especificações técnicas, indicando 52.290 kg de capacidade de carga. Outro, um bi-trem basculante também em alumínio equipado com doze pneus super-single, informava uma capacidade de carga volumétrica de 41m3³, seguida de outros detalhes:

– Tara: 13.915 kg;
– Peso bruto total combinado (PBTC): 74.000 kg;
– Tara aproximada do cavalo mecânico: 9.050 kg;
– Carga líquida: 51.035 kg;
– 3.070 kg de ganho real por viagem.

Pneus super-single possuem índice de carga 160, que equivale a 4500 kg por pneu. Com doze pneus como no caso acima, a capacidade de carga máxima dos pneus é 54.000 kg. Somando-se a carga líquida com a tara do implemento conforme divulgado pelo fabricante, temos 64.950 kg, ou um excesso de quase 11 toneladas. Por mais que haja transferência de parte do peso para o veículo trator por meio da 5ª roda, ainda assim haverá excesso sobre o limite suportado pelos pneus.

Como se isso não bastasse, a resolução 62/1998 do Contran, que regulamenta a utilização de pneus super-single no Brasil, determina que o peso bruto máximo para conjuntos de três eixos seja de 25,5 toneladas. Em se tratando de bi-trem, seriam 51.000 kg.

Pela descrição do fabricante, somente a carga líquida já está acima do limite legal admitido pelo Contran, mesmo que seja por apenas 35 kg. Mas o problema não termina aqui.

A capacidade volumétrica divulgada é de 41 m³, porém, o peso irá variar dependendo do produto ou material a ser transportado. Não se pode ignorar que tanto transportador quanto embarcador, quando avaliam o equipamento, o foco está no volume, no espaço disponível a ser utilizado.

Esse volume (41m³), quando carregado até o limite físico equivale, em quilos:

– Areia fina, seca: 49.200 kg a 67.650 kg;
– Areia molhada: 82.000 kg a 90.200 kg;
– Açúcar refinado: 68.880 kg;
– Açúcar demerara: 31.980 kg a
41.000 kg;
– Brita: 63.550 kg a 67.650 kg;
– Milho em grão: 28.700 kg a 32.800 kg;
– Minério de ferro: 100.860 kg a
106.600 kg;
– Soja: 29.520 kg.

Os dados foram obtidos no site:
http://bit.ly/1QJ3l2h

E como ficam os transportadores quando os pneus não suportarem o trabalho, por um erro de projeto?

Não é à toa que pneus super-single estão entre os que raramente são reformados, devido a péssimas condições das carcaças, que, em geral, chegam ao reformador com elevado nível de fadiga, causado pelas más condições de utilização. Sem contar as possíveis multas e retenção de veículos nos controles das balanças, além da degradação do asfalto causada pelo excesso de peso.

Estes são os aspectos menos relevantes. O pior de tudo é a possibilidade de um acidente. O que falta é os projetistas consultarem as especificações dos pneus e a legislação, quando criam soluções mágicas.

Já os transportadores, ao comprar equipamentos, precisam olhar um pouco além da capacidade volumétrica e, principalmente, questionar as “promessas” que oferecem vantagens sem informar os riscos.

Por: Pércio Schneider

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